terça-feira, 28 de fevereiro de 2017
Quando souberam do tema que a Estação Primeira de Mangueira iria levar para a Marquês de Sapucaí no Carnaval de 2017, "Só Com a Ajuda do Santo", pesquisadores, assessores técnicos e a presidente do Instituto Nacional do Patrimônio Histórico Cultural (Iphan), Kátia Bogéa, rapidamente identificaram no enredo proposto pelo carnavalesco Leandro Vieira um espaço de diálogo entre o patrimônio cultural e o mundo das escolas de samba. 

A parceria foi selada pela presidente do Iphan, durante uma visita feita à escola em novembro do ano passado. Todo o processo também é parte integrante da série de celebrações programadas para este ano em função dos 80 anos do instituto, fundado em 1937, vinculado ao Ministério da Cultura. "Este ano completamos 80 anos trabalhando na defesa, na preservação, na salvaguarda e no fomento da memória nacional. Este esforço coletivo de décadas tem ganhado cada vez mais o reconhecimento da sociedade, sendo valorizado e difundido para o mundo em eventos internacionais como de grande relevância como os Jogos Olímpicos, e agora, o Carnaval do Rio de Janeiro", disse. 

Em todo o processo de colaboração com a Estação Primeira, o Iphan cedeu mais de 60 livros, publicados pelo instituto, sobre arquiteturas religiosas, inventários e ex-votos – que designa pinturas, estatuetas ou outros objetos doados em agradecimento por um pedido atendido. Coube ao Iphan enviar ao carnavalesco outros materiais que também eram símbolos de festas com forte apelo religioso, como as máscaras utilizadas nas tradicionais Cavalhadas de Pirenópolis – realizada todos os anos como ato de renovação da fé no Divino Espírito Santo. "Para nós, era fundamental que o Leandro pudesse desenvolver as alas e as alegorias não somente com base em referências bibliográficas", afirmou Mauro. 

A cooperação com escola de samba não é novidade para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Em 2011, ano em que o Rio de Janeiro recebeu o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, o Iphan sugeriu à São Clemente que homenageasse a cidade no carnaval daquele ano. O resultado foi o enredo "O seu, o meu, o nosso Rio, abençoado por Deus e bonito por natureza". Com o desfile, a São Clemente obteve a melhor classificação da escola até hoje.
Um olhar cultural da religiosidade

Na avaliação de Leandro, os desfiles das escolas de samba, enquanto manifestação cultural, devem reforçar e enaltecer aspectos da cultura brasileira. "Quando propus o enredo 'Com a ajuda do Santo', eu queria apresentar uma página da cultura brasileira traduzida através da cultura religiosa. Este não é um enredo que fala de religião, mas propõe um olhar para a forma como o brasileiro lida com a questão espiritual", explicou. 

Para ele, a religiosidade é fruto da nossa cultura, sobretudo, da nossa mistura – de um povo formado por heranças cristãs, africanas e indígenas. "A maneira como a gente lida com a religião é uma característica muito forte do Brasil. Abordar esses temas é importante em uma festa onde o apelo mercadológico se torna cada vez mais forte, e com isso, assuntos pertinentes acabam sendo substituídos por conteúdos mais açucarados, que tendem a agradar mais em função do entretenimento", enfatizou.

Nesse sentido, a proposta de colaboração feita pelo Iphan trouxe à construção do enredo novas perspectivas. "Tudo o que será mostrado no desfile ou é tombado como patrimônio material ou é catalogado pelo Iphan. O material iconográfico e a plástica do carnaval deste ano foi inspirada em publicações do instituto", ressalta Leandro. 

A junção dos universos carnavalesco e patrimonial veio ao encontro das aspirações do artista. Leandro é formado em Belas Artes e em seu primeiro ano como carnavalesco da Mangueira, a escola foi campeã com o desfile "Maria Bethânia – A menina dos olhos de Oyá".  "Sou uma pessoa que pensa carnaval como cultura. Por isso é muito gratificante ter o reconhecimento do Iphan. Saber que estou fazendo algo que desperta o interesse de uma instituição, que se dedica à preservação dos patrimônios culturais do nosso País, chancela meu trabalho. É como se eu tivesse recebido um selo de qualidade. O gesto do Iphan foi engrandecedor. Os livros e o material que me foram fornecidos foram determinantes para que minha pesquisa evoluísse ainda mais", declarou.
Livro, documentário e exposição

A colaboração entre o Iphan e a Mangueira renderá um livro, um documentário e uma exposição, que acontecerá entre os meses de julho e setembro, no Paço Imperial, no Centro do Rio de Janeiro. 

Quando a parceria começou a ser delineada, em setembro do ano passado, o Iphan decidiu produzir um making off de todo processo criativo de um carnavalesco a partir do trabalho de desenvolvido por Leandro na Mangueira. Dentro dessa proposta, a ideia é mostrar como se dá a construção de um desfile – da concepção do enredo ao dia da apresentação na avenida -, as parcerias, o trabalho nos barracões, os profissionais envolvidos etc. "Queremos exibir o saber e o fazer do samba carioca, que é um Patrimônio Cultural do Brasil", ressaltou Mauro Chaves.

A curadoria da exposição será feita pelo próprio Leandro e por técnicos do Núcleo de Educação Patrimonial do Iphan do Rio de Janeiro. "Meu propósito é poder unir artigos oficialmente reconhecidos como obras do patrimônio, entre as quais destaco objetos de arte sacra, oratórios, entalhes e a interpretação artística que o carnaval faz de todo esse conjunto. O intuito é ter uma peça sacra original e o mesmo objeto transformado em alegoria. Ou seja, um oratório do século 19 e um oratório construído em grandes dimensões para compor a cenografia de um desfile de escola de samba. Um ex-voto original e um outro feito em isopor por artesãos do carnaval carioca", adiantou Leandro Viera. 
Desfiles do Grupo Especial

Os desfiles das escolas de samba do grupo especial serão realizados no domingo (26) e na segunda-feira (27), a partir das 22h20, no Sambódromo do Rio de Janeiro. No domingo desfilam: Paraíso do Tuiuti, Acadêmicos do Grande Rio, Imperatriz Leopoldinense, Unidos de Vila Isabel, Acadêmicos do Salgueiro, Beija-Flor de Nilópolis. O segundo dia de desfiles terá início com a União da Ilha do Governador, seguida por São Clemente, Mocidade Independente de Padre Miguel, Unidos da Tijuca e Portela. A Estação Primeira de Mangueira é a última escola a entrar na Marquês de Sapucaí, encerrando as apresentações do Grupo Especial do Carnaval de 2017.  

Assessoria de Comunicação
Ministério da Cultura


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