quarta-feira, 19 de setembro de 2018
Tratamento corrige a deformidade de forma gradual e proporciona que o paciente leve uma vida normal


Deformidade considerada grave, sobretudo pelo aspecto social, psicológico e emocional, que traz no seu bojo, o pé torto congênito na maioria das vezes, além da dor, provoca segregação e afastamento do convívio social. Entretanto, existe uma opção de tratamento simples e efetivo que, quando seguido corretamente, pode proporcionar ao indivíduo uma vida normal. O Hospital Universitário da UFMA (HU-UFMA), por meio do Ambulatório de Pé Torto, é referência nesse tipo de tratamento no Maranhão e o único a oferecê-lo na rede pública.

O serviço já funciona há dez anos e, atualmente, atende exclusivamente às terças-feiras. Uma das ortopedistas que atua no setor, Leopoldina Milanez, destaca o método que é empregado. “Utilizamos o que atualmente é considerado padrão ouro no mundo para o tratamento do pé torto congênito, que é a técnica de Ponseti. Baseia-se na correção do pé, da manipulação semanal para corrigirmos essas deformidades de forma gradual. De modo geral, 70% das crianças precisam fazer um alongamento do tendão de Aquiles, que está encurtado nesses pacientes. É um procedimento bem simples, pequeno, uma tenotomia percutânea, um corte através da pele. A criança permanece no gesso por três semanas até a cicatrização. Depois, passa a usar uma órtese até os quatro anos de idade. Essa órtese não corrige a deformidade, ela mantém toda a correção que foi feita pela manipulação do gesso”.  

A ortopedista diz que a grande dificuldade é que essa órtese deve ser usada até os quatro anos, tempo necessário para que a deformidade não sofra recidiva. “Isso precisa ser muito explicado para as mães, porque é fundamental o papel do médico, mas também o dos pais, porque são eles que vão ter que ficar colocando essas órteses nos filhos e fiscalizando o uso dela até que finde o tratamento. Durante os três primeiros meses de uso é preciso ficar com a órtese 23h por dia, depois a criança só usa por 14h, no período noturno até os quatro anos de idade”, explica.

Ada Campos, servidora pública, mãe do Nicolas, de oito meses, comemora melhora no estado do filho. “Ele é gêmeo, nasceu de 29 semanas, prematuro extremo. Ele e o irmão ficaram durante muito tempo na UTI. Eu soube da referência do hospital nesse tratamento e busquei assim que ele saiu da UTI e estava estável. Meu filho usou gesso duas semanas no pezinho direito e já fez a correção. Agora, estamos só mantendo com a órtese. Estou muito feliz com o avanço que apresentou”.         

Cerca de dez dias após o nascimento é necessário iniciar o tratamento. O problema do pé torto pode ser unilateral (apenas em um dos pés) ou bilateral (nos dois pés).  A criança precisa de uma média de quatro a cinco órteses durante todo o tratamento. Se parar de usar a órtese, de seguir o protocolo, a deformidade reincide e é necessário voltar a usar o gesso.

No passado, era necessário realizar múltiplas e amplas cirurgias para a correção dessa deformidade. Mesmo após o procedimento, o pé ficava rígido, doloroso e não era um pé plantígrado, capaz de apoiar normal. O médico espanhol Ignácio Ponseti se dedicou a estudar porque essas crianças tratadas cirurgicamente se tornavam adultos com os pés rígidos e dolorosos. Ele fez uma série de estudos anatomopatológicos, entendeu a fisiopatologia desses pés, para descobrir o que causava realmente essa deformidade. Chegou a conclusão que estavam avaliando de forma equivocada e o problema estava no ossinho chamado talus, um osso bem importante do pé.

Ele começou a estudar como reparar o defeito apenas manipulando o pé, corrigindo todas as deformidades, cerca de cinco presentes no pé torto congênito, colocando o gesso para manter aquela posição corrigida e substituindo-o, semanalmente, além de fazer a a tenotomia e, por fim, mantendo esse resultado com o uso da órtese.  Depois de adultos, pacientes submetidos ao tratamento apresentavam um pé diferente daqueles que operavam - eram flexíveis, indolores, plantígrados e com boa mobilidade.

“Não podemos acabar com o pé torto congênito, pois sempre terão crianças nascendo com a deformidade. Mas, o que quereremos é acabar com o pé torto inveterado (ocasionado pela ausência ou falha do tratamento). Como aqueles que nós olhamos nas ruas, nos sinais de trânsito, por exemplo, porque são pessoas que, às vezes, acabam sendo segregadas socialmente”, pontua a profissional

A equipe do ambulatório é composta atualmente por dois médicos ortopedistas, também professores, Leopoldina Milanez e Acyr Figueiredo. Conta ainda com uma técnica de gesso, dois técnicos de enfermagem, além dos residentes de ortopedia.   

Milaney faz parte de um grupo de cerca de 30 ortopedistas pediátricos que divulgam o método em todo o Brasil.  Já foram realizadas cinco etapas do treinamento, em São Paulo, Salvador, Brasília, Belo Horizonte e Passo Fundo. O treinamento é voltado para profissionais do SUS que atuam na clínica de pé torto.

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