segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Comprei semana passada três LP’s das es- colas de samba do Rio de Janeiro. Dois da década de 90 e um da década de 80, mais precisamente o de 1986, para poder ouvir sem parar o samba da Beija-Flor “O mundo é uma bola”, que foi hit naquele carnaval.

Pena na loja que comprei não ter mais LP’s desse estilo. Seria capaz de comprar todos que meu dinheiro desse. Cresci ouvindo samba-enredo. Minha família toda gosta muito e o Rio de Janeiro sempre in- fluenciou os estados do Nordeste e, em especial, o Maranhão.

Vejam os times de futebol. Há mais flamen- guistas, vascaínos, botafoguenses e tricolores do que motenses e bolivianos em São Luís e não me venham com essa história de que no Maranhão não tem futebol (já ouvi muito perna de pau fa- lando isso). Tem sim! É questão de amor e influência mesmo. Desde criança vejo os times do Rio fazendo a festa na Ilha.

E assim como no futebol, é com o samba e o carnaval. A ideia do carnaval na cabeça das pesso- as da minha geração era aquilo que víamos na TV: desfiles apoteóticos, mulheres peladas, ritmistas, bateria, o Clovis Bornay com sua pomposa fanta- sia e a Piná rebolando com a cabeça raspada.

Posso até dizer que tinha uma “coisinha” ou outra sobre a folia na Bahia e no Recife, mas nada que pudesse ofuscar aquele momento de alegria e de empolgação via Rio de Janeiro.

Eu sabia todos os sambas-enredo cariocas porque os LP’s começavam a ser vendidos em dezembro e desde então, essa era a trilha sono- ra dos finais de semana da minha casa. Como no futebol, tinha torcida de escolas. Sempre me identifiquei com o Salgueiro, Beija-Flor e mais recentemente com a Grande Rio.

Lembro de deitar no sofá com o encarte e acompanhar o samba e a letra e aprender um pouco sobre a história do país ou sobre um ho- menageado qualquer. Isso fazia parte da minha vida e meus amigos (mais uma vez) não conseguiam entender essa atitude um tanto madura para a minha pré-adolescência.

Como eram interessantes, inteligentes e cadenciados os sambas... Relembro com uma nostalgia gostosa de tudo aquilo e das famosas “paradinhas” com seus mestres de bateria e os “puxadores” do samba, verdadeiros embaixado- res daquela ilusão passageira chamada carnaval.

Quem não lembra do “Bumbum Paticumbum Prugurundum” do Império Serrano ou mesmo do refrão “Eu vou tomar um porre de felicidade, vou sacudir, eu vou zoar toda a cidade” da União da Ilha? Ou ainda de “Kizomba, a festa da raça” que fez a Vila Isabel campeã em 1988?

Do mês de dezembro até o carnaval, passan- do pelo Natal e ganhando força no Reveillòn, as escolas de samba do Rio de Janeiro animavam as mais variadas festas e bailes de carnaval ludovi- censes juntamente com as seculares marchinhas, que faziam qualquer múmia levantar do túmulo, bastava escutar “alalaô ô ô ô ô” seguida de “ó jardineira porque estás tão triste”. 

Todos estávamos acostumados a essa trilha sonora e de certa forma, era ela que dava o clima nostálgico às festas.

A música “Haja Deus” tema da Flor do Sam- ba (1979) era outra que não podia faltar. Todos sabiam cantar e eu, embora já cantasse naque- la época, só fui entender a letra recentemente, quando passei a estudar nossa cultura popular mais aprofundadamente.

São Luís vivia também nessa época o auge dos seus bailes de clubes e só era considerado “chique” quem tinha títulos do Jaguarema ou do famoso Grêmio Lítero Recreativo Português. As festas eram muito animadas, com big bands e toda a high society ludovicense. Um queren- do aparecer mais que o outro!

Eu, claro, nunca tive título nenhum, sempre fui do baixo clero da society e entrava nas festas meio de penetra com algum amigo ou quando tinha que pagar entrada. Todos se conheciam e muitos da geração da minha mãe (incluindo ela!) passavam o ano inteiro esperando pelos quatro dias de folia momesca nos clubes da cidade. Fantasias sempre foram bem vindas e as camisetas como entrada de festa só foram instituídas nos anos 90.

Enquanto tudo isso acontecia, eu já adolescente, ia aproveitando o que dava pra aproveitar, mesmo sem grana ou títulos de clubes importantes.

Cheguei a ir várias vezes à Praça Deodoro ver os desfiles das escolas de samba, blocos tradicionais e das tribos de índios, que confesso, sempre foram uma grande incógnita para mim desde aquela época.

Como o meu horizonte era pequeno, achava tudo grandioso e a uantidade de gente aglomerada dava a dimensão da cidade. Era realmente tudo muito grande para o meu mundo, e também muito divertido.

Os cortejos vinham do bairro da Madre Deus, Lira, Belira,Codozinho, Caminho da Boiada, Vila Gracinha e passavam pela Rua do Passeio, São Pantaleão até chegar na Praça Deodoro e dispersar pela Rio Branco.

Nos bairros, a folia também tinha vez e os vizinhos faziam batucadas e festas regadas a muita maisena. O ápice das festas de bairro era quando caíam as famosas chuvas, que banhavam nossa alma de frescor e alegria. A maisena escorria e quanto mais lambuzados, melhor ficava a festa.

Não dava pra pensar em chapinha ou escova no carnaval. Tínhamos que sair com os cabelos rebelados mesmo e nada de roupinhas novas! A maisena ou mesmo os talcos variados (também usados como alegoria de carnaval) faziam parte da brincadeira e “se zangar” era muito pior!

Aos poucos fomos tomando gosto pelas coisas da nossa terra e as músicas de compositores maranhenses e dos blocos locais foram ganhando espaço...

(Continua mês que vem)

Texto publicado na edição 81 do Jornal Cazumba, janeiro 2011 
Foto ilustrativa / internet  

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