quarta-feira, 2 de março de 2022

Há uma tragédia que se repete ano após ano, diferentemente da surpreendente pandemia ocasionada pela Covid 19. Refiro-me às notícias vindas de Petrópolis e dos fatos catastróficos noticiados neste ano que apenas se inicia.

Os olhares impotentes e abatidos se repetem: homens, mulheres e crianças contabilizam perdas e mortes em meio a destroços. Entristecidos, assistimos a essas pessoas tentando – em vão - alguma maneira de se manterem vivas, com baldes e vassouras nas mãos, calçados com botas, à procura de algo que ainda possa ser salvo.

Aterrorizados, assistimos ao desespero de quem vê os seus, soterrados e, repentinamente, desaparecidos sob monturos de lama. O clima no ar é cinzento. No chão, o marrom do lamaçal e o destino fatídico para quem vê alterada, para sempre, a configuração das famílias, da vizinhança, da cidade.

Nestes dias que se seguem ao ocorrido, os números de mortos só aumentam e as histórias infelizes são uma sucessão de dores. Uma espécie de atualização do passado, tudo muito parecido com o que ocorreu em 2011, quando houve 73 mortes por causa da avalanche. Comparadas as duas realidades – a de 2011 e a de 2022 – neste último ano, o quadro recrudesceu.

Impossível não se solidarizar e se condoer com as cenas que, pelo noticiário, invadem nossas casas: “É pau, é pedra, é o fim do caminho (...)”, é carro flutuando, é a lama, é a lama. Mas não são “as águas de março fechando o verão”, como tão bem canta Elis nos versos de Tom Jobim.

O que acontece para que situações se repitam ainda hoje? Há tempo, os estudiosos de cenários catastróficos vêm alertando para a falta de planejamento e adoção de medidas que minorem ou mesmo evitem tragédias anunciadas. Um estudo intitulado “Brasil 2040 – Alternativas de Adaptação às Mudanças Climáticas”, disponível para a consulta no Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, informa que, em pouco menos de duas décadas, seremos todos impactados por problemas advindos de secas, elevação do nível do mar e ondas de calor.

Os dados foram compilados a partir do trabalho de grupos de pesquisas que produziram conhecimento acerca de recursos hídricos, energias, zonas costeiras, infraestrutura e outros elementos fornecidos pelo painel do clima da ONU e outros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. As constatações não são animadoras. Somos, ao mesmo tempo, algozes e vítimas de tudo o que acontece à nossa volta.

No caso da cidade fluminense, um outro fator foi levantado: a ocupação desordenada da região. A região serrana do estado do Rio de Janeiro é pródiga em fortes chuvas e também em moradias precárias construídas em áreas vulneráveis. Some-se a isso a omissão do poder público em proporcionar um adequado planejamento urbano.

Não me refiro apenas à esfera municipal. O problema é antigo, conhecido, e as suas raízes são profundas. Meras explicações não têm o condão de acalmar corações, nem de resolver décadas de descaso. Mais do que chorar a desolação vivida, a humanidade pode e deve evitar mais um capítulo como este.

A própria pandemia nos ensinou que, com trabalho sério e dedicado, podemos superar os obstáculos e antecipar o futuro. As vacinas produzidas em tempo recorde são uma prova disso. Foi necessária uma hecatombe dessas proporções para que pudéssemos experimentar o que o esforço coletivo é capaz de fazer.

Em meio a tudo isso, temos uma ferramenta que nos distingue das demais espécies que povoam este planeta: a solidariedade. Mesmo com pequenos gestos, podemos sim minorar as tragédias e tristezas de toda sorte que se nos avizinham, sem esquecer que essa coleção de memórias trágicas tem causas. São problemas que precisam ser solucionados para o caos não nos parecer, ano a ano, dia a dia, atualizado. Até porque, se isso é possível para alguns ainda não atingidos diretamente, para outros os danos e as dores já são irreversíveis.

Informação: UFMA  

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