sábado, 7 de janeiro de 2023


Meia-noite. Fim
de um ano, início
de outro. Olho o céu:
nenhum indício.

Olho o céu:
o abismo vence o
olhar. O mesmo
espantoso silêncio
da Via-Láctea feito
um ectoplasma
sobre a minha cabeça
nada ali indica
que um ano novo começa.

E não começa
nem no céu nem no chão
do planeta:
começa no coração.

Começa como a esperança
de vida melhor
que entre os astros
não se escuta
nem se vê
nem pode haver:
que isso é coisa de homem
esse bicho
estelar
que sonha
(e luta).

Ferreira Gular nasceu em São Luís do Maranhão, em 1930. Dividiu os anos da infância entre a escola e a vida de rua, jogando bola e pescando no Rio Bacanga. Quando descobriu que teria que tornar-se adulto, escolheu tornar-se poeta.


  • Como escritor, seu lema era uma frase Gauguin: “Quando eu aprender a pintar com a mão direita, passarei a pintar com a esquerda, e quando aprender a pintar com a esquerda, passarei a pintar com os pés”.

Assim, inventando uma linguagem a cada poema, José Ribamar Ferreira foi também jornalista, biógrafo, crítico de arte e um dos maiores nomes da literatura brasileira do século XX.

Em sua obra “Ano Novo”, o narrador olha para o céu e não vê nada de diferente. É noite da virada, da mudança e do recomeço. Mas, depois de tantas promessas, por que é que tudo continua igual?

A gente sabe muito bem que os astros vão continuar do jeito que eles sempre foram, porém, uma coisa é inegável: quando chega meia-noite, até os mais céticos são contaminados pela esperança do Ano Novo.

Ainda assim, o poeta tem razão ao dizer que, “lá fora”, nada muda. O céu continua o mesmo, mas a ideia genial de cortar o tempo em fatias é capaz de transformar a nossa percepção de ciclos.


  • E, pensando bem, se a mudança acontece em nosso coração, por que não aproveitar dessa ideia fabricada?

Talvez você não seja fã de rituais, e já tenha se cansado da mesma conversa todo final de ano. Mas, só talvez, essa esperança industrializada consiga te fazer sonhar — e lutar — por um 2023 melhor.

Afinal, como bem dito pelo poeta, somos bicho estelar que sonha e lutaFinalizando com Milton Nascimento, não são os astros que nos transformam, mas a “nossa estranha mania de ter fé na vida”.

Informação: The News 

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