domingo, 5 de março de 2023

Se você acredita que só seria realizado em outro tempo ou espaço, saiba que é tudo ilusão: a felicidade está onde se deseja. simples — e nada simples — assim.

Meia-Noite em Paris


Lançado em 2011 - e vencedor do Oscar de Melhor Roteiro em 2012 - o filme "Meia Noite em Paris" é uma ode a história da arte e aos encantos da cidade luz.
Na história, Gil é um roteirista de Hollywood desiludido com a sua carreira e o seu casamento. Como uma dessas pessoas que acredita ter nascido na época errada, ele é fissurado pela França dos anos 1920.
Durante uma viagem com a família de sua noiva à Paris, misteriosamente, seu desejo é realizado. Todos os dias, à meia-noite, o escritor embarca no tempo para viver algumas horas na sua “década dos sonhos”.

Para quem já é apaixonado por Paris — seja pessoalmente ou através de cartões postais —, a trilha sonora e a fotografia do filme, certamente, proporcionarão uma experiência imersiva e tanto.

• Mas, ainda que você não tenha simpatia pela cidade, o filme traz uma ideia que serve pra qualquer tempo ou espaço: a nossa eterna insatisfação com o presente.
É normal se encantar pela arte de outra época ou lugar, mas, essa nostalgia obsessiva pelos “tempos áureos da humanidade” costuma ser apenas um reflexo de infelicidade com a própria vida.

No caso de Gil, mudar-se para Paris pode ser a fuga de um casamento que ele sabe que não deseja. Na outra ponta, voltar para a década de 20 seria a solução para curar a sua falta de inspiração na escrita.

Independentemente da circunstância em que se vive, as pessoas tendem a acreditar que em determinada época ou lugar elas seriam mais felizes.

À primeira vista, essa realidade mostrada no filme pode parecer pessimista, mas a mensagem final é libertadora: a felicidade está onde se deseja. 

Um vinho, um rio e um croissant

(BASEADO EM UMA HISTÓRIA REAL)


Depois de alguns meses vivendo na França, a Mariana já estava acostumada a repetir os mesmos programas. Naquele sábado, era uma festa como outra qualquer, até o Julio puxá-la pra dançar.

• Ela lembra de se arrepiar quando sua mão tocou o pescoço daquele colombiano, e de como o “boa noite” deu vontade de emendar no “bom dia”

No domingo, um convite para tomar um café na Place Jean Jaurès rendeu três meses de passeios noturnos em vielas estreitas, borracheras e infinitos beijos.

Julio detestava ter que falar inglês, e a Mariana nem cogitava conversar em francês. Juntos, eles descobriram que o português e o espanhol não são tão parecidos assim, mas se esforçavam do jeito que dava.

Ela estava com os dias contados na França, mas prometeu que não choraria na despedida. Assim, trocou o “tchau” por um “até breve”, e foi embora esperando uma visita do Julio em São Paulo.

• Dito e feito. Um mês depois de deixar a França, a Mariana foi buscar o seu “amor de inverno” no aeroporto de Guarulhos.

Ele disse que o trânsito de São Paulo não era nada comparado ao de Bogotá. Ficou fascinado pela Faria Lima e só queria saber dos botecos de Vila Madalena.

A Mariana diz que o Julio tem alma de carioca. Ele se encantou pela Lapa e aprendeu a cantarolar vários sucessos da bossa nova. Em todos os bares, fazia questão de pedir uma caipirinha — cachaça e limão, por favor.

Ela pensava que não tinha como sentir-se mais apaixonada, mas foi quando eles assistiram ao pôr-do-sol no morro do Pão de Açúcar, e ele sussurrou “eu te amo”, que a Mariana decidiu: Au revoir, Brésil. 

Os dois, então, estavam na mesma cidade. Poderiam pegar um cinema em uma quarta-feira qualquer, beber uma garrafa de vinho à margem de algum rio, e acordar com um croissant pela manhã.

• Durante um bom tempo, repetiram todos esses programas, e o Julio até ensinou a Mariana a andar de bicicleta.
Os amigos diziam que era impossível compreender um diálogo entre eles, já que tinham uma “mistura organizada” de português, francês e espanhol. Secretamente, a Mariana adorava ter criado um espaço que era só dos dois.

Quando fizeram três anos juntos, ela escreveu uma carta, desejando que eles “se perdessem por aí, mas nunca se perdessem um do outro”.
Naquele momento, a Mariana já sabia que não haveria mais um “até breve”. Inclusive, ela lembra de vários acontecimentos que marcaram o fim, mas prefere recordar das lembranças do começo.

• Agora, ela só queria dizer que a única vez que realmente apreciou o som de um violino foi naquele entardecer na escadaria em Montmartre. 
Até hoje, não encontrou vista mais bonita do que o Julio esperando por sua chegada na estação de metrô. Ah, seu maior prazer também continua sendo beber algumas garrafas de vinho à margem de um rio qualquer.

Ela queria contar pra ele que assistí-lo estudar economia é apaixonante. E que vê-lo de saco cheio de solucionar fórmulas complexas, para depois fazer um mestrado em finanças, foi engraçado. 

Por fim, a Mariana gostaria de falar que não se arrepende por não ter prolongado a última noite dos dois. Tomar distância foi difícil, mas ela conhece bem o vazio que sentiria ao deixar a cama pela manhã.
Agora, se fosse possível, ela voltaria ao último beijo. Já nem se lembra onde e como aconteceu, mas o beijaria lentamente, apreciando a dor e a delícia daquilo que foi — e continua sendo — só deles.

Se tivesse uma máquina do tempo, ela diria ao Julio que nunca precisou de nenhuma promessa, mas que também se orgulha por ter ido embora enquanto ainda existia amor.


Texto e imagens: The stories


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