domingo, 21 de maio de 2023
Se alguém está ocupando o seu peito de saudade, pense pelo lado bom: ainda que o outro vá embora, as memórias ficam sempre com a gente.

Confesso que vivi

(Imagem: Pinterest / Reprodução)

Saudade é solidão acompanhada, é quando o amor ainda não foi embora, mas o amado já... Saudade é amar um passado que ainda não passou, é recusar um presente que nos machuca, é não ver o futuro que nos convida... Saudade é sentir que existe o que não existe mais... Saudade é o inferno dos que perderam, é a dor dos que ficaram para trás, é o gosto de morte na boca dos que continuam. Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade: aquela que nunca amou. E esse é o maior dos sofrimentos: não ter por quem sentir saudade, passar pela vida e não viver. O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido. E disso, meus amigos, eu não posso ser acusado: vivi, sofri, me apaixonei por tudo o que a vida me ofereceu!... Confesso que vivi!

Naquele mesmo espírito de “escrito por Clarice Lispector”, esse trecho é atribuído de forma errônea a Pablo Neruda. Isso porque, o final “Confesso que vivi!” é o título de um de seus livros.

• Longe do escritor chileno, a citação é uma fala do personagem Afonso, da novela Fera Ferida, escrita por Aguinaldo Silva.

No sucesso da Globo, Afonso Henriques foi um poeta que interrompeu sua carreira depois de perder tudo para o alcoolismo. No final da história, ele se apaixona pela protagonista — e para de beber.

Saindo do contexto da novela e entrando na nossa reflexão, poucos trechos conseguem retratar a saudade de forma tão poética e precisa como esse de Aguinaldo Silva.

Apesar de estar sofrendo, ao dizer que “a saudade é uma solidão acompanhada”, ele já mostra um pontinho de otimismo de quem sabe que a ausência não é falta — mas uma presença constante.

• Usando as palavras de Peninha, “saudade até que é bom, é melhor do que caminhar vazio”.

Na prática, porém, a gente sabe que dói. Afinal, como o próprio Aguinaldo diz, “saudade é o inferno dos que perderam” e só deseja esse sentimento a pessoa que nunca amou.

Mas, continuando o texto, tem uma coisa que ainda é pior do que essa falta: não ter por quem sentir saudade. 

Se a sua experiência de um grande amor já passou, ou não foi recíproca, agradeça pela capacidade de sentir. No final das contas, amar é só pra quem pode — e não pra quem quer.

Um recado pra Clara

BASEADO EM UMA HISTÓRIA REAL

(Imagem: VSCO / Reprodução)


Era uma terça-feira fria, no final de maio de alguns anos atrás. A Carol estava indo encontrar com uma amiga, até que deu de cara com a Clara.

• Elas não se conheciam, mas alguns amigos em comum foram suficientes para a troca de contato.

A Carol deu uma cutucada pelo direct, mas foi só em julho que o primeiro encontro aconteceu: foram em um cinema alternativo da cidade, e emendaram a noite em uma pizzaria.

Falaram sobre livros, filmes e algumas histórias engraçadas. Na hora de ir embora, a Carol perguntou onde a Clara morava. Dando risada, ela disse que morava na mente dela — e não mentiu.

Era só o primeiro jantar, mas a Carol foi dormir com o coração pulsando. Em suas palavras, pra quem está acostumado com os papos vazios de balada, é raro encontrar alguém interessante.

• Os dias foram passando, os assuntos rendendo e a paquera ficando cada vez mais gostosa. 

A Clara gostava de filmes de suspense, e a Carol, de super-heróis. Compartilhavam a mesma paixão por pratos diferentes, e alternavam entre bares de esquina e restaurantes bacanudos da cidade.

Toda vez que a Clara via algum bichinho na rua, tirava foto pra Carol. Quando descobriam alguma música nova, mandavam uma pra outra — e até criaram algumas playlists compartilhadas.

A vida delas era muito corrida, mas sempre davam um jeito de se encontrar. Seja 10 minutos depois do trabalho, ou em almoços rápidos nos self-services de São Paulo. 

• Nesse meio tempo, tiveram alguns desencontros. Começavam com aquele medo do “estamos indo rápido demais”, mas sempre acabavam em pedido de desculpa e abraço de saudade.

Na última, resolveram que “agora era pra valer” e mergulharam profundamente na vida uma da outra outra. Compartilharam família, amigos, escova de dente e até fizeram algumas viagens juntas.

A Carol aprendeu a gostar de comida japonesa, e a Clara passou a apreciar bons vinhos. Trocaram alguns jantares por noites cozinhando em casa e aprenderam a fazer tapioca pro café da manhã.

É claro que também tiveram desentendimentos, mas a Carol escolheu focar nas partes gostosas da história. Em vez de contar como chegaram no ponto final, preferiu reviver as memórias do começo.

• Inclusive, ela se lembra de como sofreu quando a Clara quis se afastar, mas sabe que as duas precisavam resolver alguns empecilhos.

A Carol nunca pensou que escreveria uma história de amor depois de um término, mas fica contente por ter vivido isso tudo. Ah, ainda que algumas lágrimas tenham escorrido na noite final, ela foi muito feliz.

Pode ser que esse texto nem chegue na Clara, mas, se ela estiver lendo, a Carol queria contar que está terminando de ler “O amor não é óbvio” — e agora entendeu porque a Clara gostava tanto desse livro.

• A Carol também queria falar que viu o último boomerang que a Clara postou, toda arrumada, e que ela estava linda como sempre. 

Todos as mensagens de “bom dia” e “estou com saudades” foram sinceras. Se pudesse voltar no tempo, ela não mudaria nada — talvez só enrolaria mais pra sair da cama aos domingos. 

A Carol espera, do fundo do coração, que elas possam continuar essa história de uma forma mais madura. Mas, se isso não for possível, ela só tem um desejo: que a Clara encontre alguém que a faça muito feliz.

Informação: The Stories  / Reprodução

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