terça-feira, 30 de abril de 2024
Megaporto e ferrovia ocuparão 87% de território quilombola no Maranhão. Mas moradores não sabem.
A PAISAGEM da Ilha do Cajual, no Maranhão, vai mudar. A mata frondosa e os palmeirais de coco babaçu vão ser substituídos por navios cargueiros de até 350 metros de comprimento, levando milhares de toneladas de ferro, cobre, soja, milho e outras commodities para a China, Estados Unidos e Europa.
Até 2027, os quilômetros de praias e mangues darão lugar a um complexo portuário, com linhas férreas, subestações de energia e galpões, onde 1,8 mil trabalhadores vão se revezar dia e noite na ilha do município de Alcântara
Esta é a mudança que os portugueses naturalizados brasileiros Paulo Salvador, Nuno da Mota e Silva e Nuno Martins, da empresa Grão-Pará Maranhão, a GPM, pretendem concluir. A ideia é ocupar quase 90% do Território Quilombola Vila Nova, na Ilha do Cajual, com o Terminal Portuário de Alcântara e a ferrovia EF-317.
“Um empreendimento dessa envergadura, na prática, extingue o território quilombola. Inviabiliza por completo a proteção do território”, explicou Yuri Costa, defensor público da União no Maranhão. A defensoria entrou no ano passado com uma ação civil pública que cobra a titulação do quilombo.
O projeto foi pensado para escoar soja e outras commodities do agronegócio e da mineração para China, Estados Unidos e países da Europa. Mas, no estudo de viabilidade encomendado pela GPM, o principal produto a ser transportado é o minério de ferro, extraído pela Vale S.A. da Serra dos Carajás, no Pará.
Hoje, o minério é escoado pela Estrada de Ferro Carajás até o Terminal Portuário Ponta da Madeira, em São Luís, ambos operados pela Vale. O projeto, segundo a GPM, é uma “resposta à necessidade de satisfazer a demanda futura para exportação de minério de ferro, através de um porto de águas profundas”.
A Ilha do Cajual é uma Área de Proteção Ambiental das Reentrâncias Maranhenses, com importância internacional. É um ambiente “bastante preservado” e sensível, segundo um relatório do Ibama de 2018, e ainda abriga fósseis de dinossauros que habitaram a região há cerca de 95 milhões de anos.
É também uma área quilombola onde 51 famílias, cerca de 92 pessoas, vivem de pesca, agricultura e criação de pequenos animais – um modo de vida herdado de seus antepassados, trazidos na condição de escravizados há pelo menos três séculos.
O processo para titular o território como quilombola no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, o Incra, e na Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União no Maranhão se arrasta desde 2007. O processo é a única forma de dar às famílias a regularização definitiva do terreno.
No entanto, em 2017, a Associação de Moradores da Comunidade Negra Rural Quilombola de Vila Nova Ilha do Cajual assinou um contrato cedendo o uso e usufruto de mais de 14 milhões de metros quadrados do território – ou 1,4 mil campos de futebol – para a instalação e operação do porto. O acordo, em nome de toda a comunidade, é válido por tempo indeterminado.
Com investimento bilionário e duas autorizações federais outorgadas, o empreendimento da GPM prevê parceria da empresa pública alemã Deutsch Bahn e tem forte apoio do atual governo federal e do governo do Maranhão.
Porto ocupará 87% do território quilombola
Agora, a comunidade está prestes a assistir ao início das obras, mesmo sem as devidas consultas legais. Em 2 de janeiro, o Ibama, órgão federal responsável por conceder ou não as licenças para o empreendimento, informou que a GPM ainda não tinha entregado todos os documentos que detalham os impactos socioambientais da obra.
O território quilombola da Ilha do Cajual ocupa uma área de pouco mais de 1.630 hectares, ou 1.630 campos de futebol, de acordo com dados do Cadastro Ambiental Rural, o CAR. Comparando as coordenadas geográficas da área terrestre do futuro porto, com as do território quilombola, é possível constatar que a associação permitiu que mais de 87% do território seja devastado para instalação do Terminal Portuário de Alcântara.
Leia a matéria a matéria completa: https://www.intercept
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