segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Tenho trinta e poucos anos, não mais que isso. Juro!

Quando falei aqui das minhas lembranças de infância, recebi inúmeros e-mails parabenizando o texto e, ainda, outros diversos de leitores desacreditando que eu pudesse ter vivido tudo aquilo.

Para provar o que tinha escrito resolvi, no mês subsequente ao texto da minha infância, escrever sobre as minhas férias adolescentes. Novamente recebi congratulações de muitos incrédulos, que não mais para minha surpresa, não acreditavam na minha “balzaquianice”.

Pois bem, não levanto bandeira de mulher madura nem tampouco me acho nova demais. Acho que o melhor de ter “trinta e poucos” é ter podido viver o que vivi e ter experimentado um modus vivendi provinciano quase beirando a inocência que me faz ter ótimas lembranças e muita saudade.

Quando vejo a profusão de lojas na cidade e o crescimento desenfreado das opções de entretenimento, fico muito entusiasmada e ao mesmo tempo boboca, porque sou do tempo em que se divertir era ir ao Cine Passeio e depois lanchar no Beijo de Moça. Esse programa era quase o máximo que podíamos ter e a sessão das 17h já era tarde pra voltar de ônibus pra casa. As caixinhas e os coraçõezinhos da lanchonete mais famosa e gostosa da Ilha eram inconfundíveis.

Uma outra boa opção era ir ao único shop- ping center da cidade (o Tropical) comer cachorro quente no Komi Keto e poder escolher o que vinha dentro! Um luxo nunca dantes imaginado por nós. Tanto o shopping quanto escolher o recheio do hot dog!


Os programas nessa época estavam focados quase todos para a região do Centro da cidade, onde de fato era o nosso centro comercial. Estavam lá as lanchonetes, as lojas de roupa, de sapatos e de “fazendas”.

Como era bom sair aos sábados pra ir à Rua Grande com mamãe e passar na Xepinha pra comprar umas fazendas para uns vestidinhos novos. De lá, era obrigatório ir à Lobrás pra comprar bombons (ou pegar uns dois escondidos...) e produtos de higiene. Leite de Rosas, Neutrox e Kolene eram figurinhas fáceis em nossas sacolas.

Os melhores utensílios de casa comprávamos nas Lojas Acácia ou Casa Paris. Era cada coisa de encher os olhos...

Camisetinhas básicas, vestidinhos e leggings só podiam ser compradas na Sabina. Às vezes, era possível achar alguma coisinha nas lojas Pernambucanas, mas a desculpa de ir lá era pra subir na escada rolante, a única da cidade! Ah, e sem falar que a loja era climatizada e isso dava um gás novo para continuarmos a bater perna pelos paralelepípedos da agitada rua.

Os sapatos da moda estavam na Clark, Lojas Wilson e até na Arpaso, mas essa última parecia sempre que tudo era mais caro!

Artigos masculinos? O lugar ideal era a Ocapana. Nossa como aquela loja tinha cara de homem. E homem sério!

A Rua Grande representou muito para mim e durante muito tempo aquela área era nosso horizonte, que apenas se estendia para a Rua da Paz, Santana e Sol, cada uma com suas peculiaridades e simpatia.

A Mara Sport e Baby, na Rua da Paz, eram os locais ideais para minhas roupinhas de férias, como shortinhos e vestidinhos para ir a Humberto de Campos. Na Rua de Santana eu ia sempre com um só propósito: comprar os meus apetrechos de balé. Polainas, colãs e meias-calças.

A vida ia muito bem obrigada, quando surgiu um prédio enorme em meio à Rua Grande que deixou todos atônitos, alegres e convencidos: a Mesbla! O que era aquilo, gente? Pra simplificar: tudo!

A ida ao centro ganhou novo objetivo e entrar naquela loja já era motivo suficiente pra ser feliz! Não precisava comprar nada, mas sentir o cheiro das roupas e ver as novidades vindas do Sul e Sudeste nos dava alma nova. Como era bom tudo aquilo...

Hoje as coisas são naturalmente muito diferentes, maiores e diversas. Nossos horizontes se ampliam a cada clique em uma nova página na internet e as lembranças de hoje estão misturadas em uma babel de acontecimentos.

A Rua Grande não tem mais o glamour de outrora e a King Jóia não resistiu às Óticas Diniz, o que eu considero uma pena, pois quase nada do que citei resistiu às novas regras do mercado, me fazendo crer que construímos tudo errado!

Pode ser que daqui ha vinte anos o meu “hoje” esteja organizado na memória e eu possa fazer um textinho simples como esse, mas que à medida que as letras apareçam na tela, o cheiro, a cor do céu e o sabor do lanche ainda possam me alimentar de saudade e esperança.

Ter “trinta e poucos” dá uma certa notoriedade, não?

Texto Originalmente publicado na Edição N° 74, junho 2010 do Jornal Cazumbá
Foto Ilustrativa / Internet

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