segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Aos poucos, fomos tomando gosto pelas nossas coisas e as músicas maranhenses começaram a fazer parte do nosso mundo carnavalesco. Os sambas feitos pelos nossos compositores foram entrando em nossas comemorações, grupos carnavalescos foram aparecendo e mais que de repente, “Vou passear lá ia lá ia lá ia lá ia lá ia lá ia. Vou de canguru, vou de macaquinho vou de catitu peba e gambá e lá bem veado bicho corredor”... Não há festa maranhense sem esse hit e convenhamos, é muito divertido!

Antes de começar a ir para a Deodoro ver a folia, participar de bailes nos clubes chiques da cidade, e pular no “siri com cãimbra” no circuito Madre Deus, meus carnavais eram regados a brincadeiras genuínas e muito tradicionais, nos conhecidos blocos de sujo e bailes à fantasia em Humberto de Campos, num salto cronológico rápido para a minha infância.

Eu acordava cedo para me preparar para a brincadeira. Mamãe comprava roupinhas novas que voltavam pra São Luís imundas, dando razão ao papai, novas para ir para o interior. Como o dinheiro não era meu, eu pouco me importava com isso e adorava me preparar adequadamente para esse período. Vem daí a minha paixão por tudo que está relacionado a carnaval: roupas, brilhos, plumas, fantasias e paetês!

Shortinhos e camisetas no corpo bastavam para eu me juntar aos inúmeros amigos com pistolas, bombas d’água, garrafas e balões. A nós, se juntavam todos com caras pintadas, os “enlameados” e os com as tintas nas mãos, formando uma verdadeira multidão para a minha visão de 14 anos. Jogando uns nos outros todo tipo de “meleca” colorida possível, saíamos pelas quatro ruas do município, acompanhados por uma bandinha tocando marchinhas de carnaval e alguns (incluindo eu) batendo em latas com varetinhas fora do ritmo.

Ao término de tudo isso eu não conseguia imaginar festa mais animada que aquela. Sair pelas ruas dançando, tocando e “tomando gosto” com todo mundo era pra lá de divertido! Como pode ter acabado? Não me conformo!

A essa altura eu já tinha meus momentos de popularidade. Como a cidade era muito pequena, todos conheciam todos e eu já aglomerava uma meia dúzia de amigos, pois desde os 7 anos de idade, tinha sido apresentada por vovó à sociedade humbertuense e de lá, até bem pouco tempo, não queria sair!

Fiz muitos amigos desde que comecei a passar minhas férias escolares na “Miritiba” (nome da cidade até 1934). Muitos amigos também iam de São Luís e todos nos encontrávamos para esses carnavais inesquecíveis. Vovó, sempre aprontando com a minha obediência e boa vontade, fazia teatrinhos e blocos de carnaval. Adivinhem o que acontecia? Eu saía, claro.

Os carnavais mais memoráveis que passei foram os que saí de odalisca e outro num bloco carnavalesco chamado “Pirulito”. Foi dançando no salão do único clube da cidade que consegui os meus primeiros admiradores e potenciais namoradinhos. O rabo de cavalo imitando “Jeannie é um gênio”, a sapatilha brilhosa, a maquiagem com os olhos puxados por um delineador e as estrelinhas que mamãe colava no rosto não saem da minha cabeça. Fiquei com medo da marchinha que dizia que no vestibular daquele ano iriam raspar cabeça de mulher... Nada comparado ao medo dos fofões. Bastava ter um, para eu me esconder em qualquer brecha. Até uns 12 anos essas figuras me amedrontavam e não consigo lembrar do momento em que percebi que tinha um homem embaixo daquela roupa.

O “Pirulito”, bem, esse era uma invenção minha Vó com outras amigas também invencionistas. Saíamos apenas meninas em duas filas indianas acompanhadas de uma bandinha composta de banjo, cavaquinho, tarol e saxofone, cujos músicos, infelizmente, só restam alguns. As ruas da Miritiba se tornavam extensas para nossa folia e parávamos em algumas casas de apoio ao logo do desfile para fazermos apresentações, que nada mais eram que cantar a música “pirulito que bate bate, pirulito que já bateu” e fazer umas piruetas ensaiadas por Vovó. Nos ofereciam como “paga” bolos, sucos, chocolates e biscoitos e acreditem, ficávamos muito agradecidas, sim senhor! Até hoje os amigos miritibanos me lembram, (pra não dizer, sacaneiam!) desse esfuziante momento.

E assim os carnavais foram passando e as lembranças, graças a Deus, permanecem aqui como um órgão vital. Sem elas eu não conseguiria viver. É muito bom ter as lembranças do Baile do Bigorrilho, sempre concorrido e que nunca pude entrar. A cidade se preparava para ele e as pessoas corriam de um lado para o outro para comprar fantasias. O carnaval oficial começava ali. Também naquela época, eram comuns os termos “sábado gordo de carnaval”, “domingo magro”. Hoje não mais...

A primeira vez que vi uma Casinha da Roça, sorri de ver uma senhora socando um pilão. Era criança demais para perceber o simbolismo de tudo aquilo e só muito tempo depois descobri que era um retrato da nossa gente mais humilde e não por isso, mais guerreira.

Não dá pra esquecer da cadência inocente dos Fuzileiros da Fuzarca e porque não, das lembranças das fotos dos Corsos, que infelizmente não tive a sorte de ver...

E são com essas lembranças que me emociono ao tentar descrever, para quem sabe, um ocioso querido ler e tentar imaginar como era...

Texto Originalmente publicado na Edição N° 82 fevereiro 2011 do Jornal Cazumbá
Foto ilustrativa/Internet

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