sexta-feira, 8 de maio de 2020
Mudanças climáticas ameaçam a Amazônia e, consequentemente, disponibilidade de recursos hídricos para países da região. Foto: Flickr (CC) / Dams999

Por Katyna Argueta*

O novo coronavírus reduziu as emissões de efeito estufa mais rapidamente que anos de negociações internacionais e certamente conseguiu despertar a consciência global muito mais depressa do que a mudança do clima. Foi capaz, em poucas semanas, de gerar alteração de hábitos, consenso político e aceitação mais ou menos ampla de medidas de distanciamento social, enquanto a mudança global do clima parece ter ainda que justificar, entre alguns setores, a importância de modificar hábitos de consumo, reciclar ou reutilizar, para garantir a sustentabilidade do planeta.

Em meio aos esforços da sociedade para combater a pandemia do novo coronavírus, passou despercebida no Brasil a assinatura do documento de projeto Pagamentos por resultados de Redd+ (redução de emissões provenientes de desmatamento e degradação florestal) por resultados alcançados pelo país no bioma Amazônia em 2014 e 2015 com recursos do Fundo Verde para o Clima (GCF, em na sigla em inglês), cujo objetivo é expandir a ação humana coletiva para responder à mudança global do clima. Tem financiamento de 49 países/regiões/cidades, incluindo nove países em desenvolvimento.

O projeto, assinado pelo Ministério do Meio Ambiente, Ministério das Relações Exteriores e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), é histórico tanto no plano mundial quanto no nacional. Trata-se da primeira proposta em nível global no âmbito do programa piloto de pagamentos baseados em resultados do Redd do GCF. Ademais, nacionalmente, representa mudança de paradigma no sentido de buscar remunerar quem preserva a floresta Amazônica por meio de compensação por serviços ambientais.

Conhecidos também como pagamentos por serviços ecossistêmicos ou PSA, os recursos se destinam a proprietários e administradores de terras ou outros espaços que concordaram com determinadas ações voluntárias para gerenciar os bens naturais ali existentes com vistas a fornecer um serviço ecológico que dificilmente poderia ser fornecido ou mantido na ausência de pagamentos. Os “serviços” podem incluir a proteção de bacias hidrográficas, a conservação da biodiversidade, a promoção do estoque de dióxido de carbono por meio, por exemplo, do replantio de árvores, da manutenção da floresta em pé ou do uso de diferentes técnicas agrícolas.

Trata-se, portanto, de instrumento para promover a conservação e solucionar as falhas do mercado relacionadas ao meio ambiente. A abordagem reconhece o importante papel que o ambiente desempenha para o bem-estar e a prosperidade econômica. Desde o primeiro projeto piloto na Costa Rica, em 1997, número crescente de iniciativas de PSA foi implementado em comunidades, regiões ou países. Exemplos incluem o programa nacional do México para proteção florestal, políticas agroambientais nos Estados Unidos e na União Europeia, serviços ecossistêmicos para proteção de chimpanzés nas florestas de Uganda e o Programa de Conversão de Terrenos em Encostas da China.

O PSA é diferente dos instrumentos convencionais de política ambiental ao operar por meio de incentivos, ao invés de desincentivos (como regulamentos legais, mecanismos de sanções ou impostos). O recurso configura tanto sua virtude quanto seu maior desafio. Se bem planejados, os pagamentos podem ser solução eficiente na consecução de objetivos ambientais com significativos benefícios socioeconômicos. No entanto, o design deficiente pode levar ao desperdício de meios financeiros ou induzir efeitos comportamentais adversos.

As discussões sobre a eficácia dos pagamentos por serviços ambientais devem ser estimuladas, considerando que oferecem ferramenta política para a verificação das sinergias e o equilíbrio entre as dimensões ambientais, sociais e econômicas enfatizadas pela Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Ademais, o reconhecimento do valor econômico dos recursos naturais pela sociedade fornece arcabouço relevante para que os setores público e privado trabalhem juntos.

A crise ambiental parece geral e distante, enquanto o novo coronavírus é imediato. Estamos menos dispostos a modificar nosso comportamento quanto mais distantes nos pareçam as consequências de não o fazermos. Atendemos ao urgente e ao mais visível frente ao tardio e silencioso e isso confirma que, como sociedade, funcionamos à base de pressões e incentivos.

Em meio a tantos textos e reflexões sobre o combate ao novo coronavírus, não é, portanto, estranho falar de incentivos como os pagamentos por serviços ambientais. Afinal, meio ambiente saudável e bem-estar são fundamentais à vida, à sociedade e à economia. De nossas decisões dependerá construir um futuro sustentável no qual os habitantes possam ser capazes de resistir a suas provocações.

*Katyna Argueta, representante-residente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no Brasil.

Informação: Nações Unidas 

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