segunda-feira, 6 de julho de 2020


Há muito tempo, os recursos de telecomunicações, digo telefones, não eram assim pá pum! Nada de abrir a bolsa, pegar um telefone pequeno, tocar levemente algumas vezes e na mesma hora conseguir falar com alguém em qualquer lugar.

A começar que telefone era um artigo de luxo. Era preciso ficar em lista de espera e custava caro ter um, além de mantê-lo e de pagar as contas no final do mês. Lembro-me do primeiro telefone de disco da minha casa e também do número facílimo, ainda com apenas sete dígitos e que todos os parentes tinham de cabeça. Por muitos anos aquele número funcionou como uma verdadeira lista telefônica. Quem queria saber um número de alguém da família ou amigo da família, bastava ligar para mamãe que ela informava mediante uma rápida consulta na agenda, que, por sinal, era sempre desorganizada aos olhos dos outros, mas para ela, funciona bem até hoje!

Quando comecei a passar as férias longe da minha mãe, só tinham três formas de nos comunicarmos, dada a distância abissal da capital até o interior: por meio de cartas, recado via parentes ou por telefone. Este último, obedecia ao ritual imposto pelo único telefone de Humberto de Campos: o do posto telefônico da TELMA – Telecomunicações do Maranhão S.A.

Tenho lembranças de que o posto era uma reivindicação antiga dos humbertoenses e que demorou a chegar por lá. O atraso nas questões de comunicação era muito grande, isolava um lugar que fica a 182 km da capital como se estivesse a 1000. Tudo era difícil por causa dessa limitação. Quando o telefone chegou, levou o progresso, a facilidade e porque não dizer, a modernidade.

O posto ficava localizado no final da rua do meio. Era uma casa adaptada com duas cabines telefônicas e um salão de espera relativamente grande para os padrões da época, com um banco contínuo parecendo de igreja, encostado na parede de frente para a telefonista, que por sua vez, ficava atrás de um balcão munida de dois telefones. O espaço era escuro e fazia muito calor, principalmente nas duas cabines.

O ato de telefonar e de receber um telefonema era um processo lento e tinha duas situações distintas: uma, quando eu queria ligar para casa e outra, quando a minha mãe ligava. Nesta última situação, o processo era o seguinte: minha mãe ligava para a telefonista de plantão, que anotava o nome de quem ia falar, com quem queria falar e a previsão do tempo de retorno da ligação.

E como é que eu poderia estar lá, se não sabia que minha mãe tinha ligado? Pois bem, o responsável por essa mágica da tecnologia, era o mensageiro do posto telefônico!

Na verdade não era apenas um, mas vários mensageiros, divididos em turnos.

Geralmente eram jovens conhecidos por todos da cidade e eram eles que tinham a missão de levar os recados a todas as pessoas de Humberto de Campos, vejam vocês.

Na época, é claro, eu não fazia ideia da importância daquele trabalho para todas as pessoas do lugar e nem tinha a real dimensão da utilidade de um telefone, apenas compartilhava do sofrimento de todos os mensageiros, pelo andar dia e noite em ruas com areia até o meio das canelas e acrescento: eram rápidos para percorrer léguas com um papelzinho em mãos com o recado anotado pela telefonista.

O mais difícil de todo o trabalho de levar os recados era sem dúvida, quando a pessoa não estava em casa. O pobre do mensageiro tinha que sair procurando o fulano por vários lugares até encontrá-lo. A sorte, no entanto, é que era tudo muito menor.

Era comum ver os meninos “caçando” o povo no mercado, no cais, no matadouro e por aí vai. Eu, por várias vezes, recebi os recadinhos enquanto brincava de “elástico”, “queimado”, ou de “rouba -bandeira”.

Dentro do posto, nos deslocávamos para as cabines quando a telefonista mandava e fechávamos a porta para que ninguém escutasse o assunto, embora não adiantasse muita coisa. Quando era uma recomendação ou bronca da mãe, falávamos baixinho, mesmo com o calor sufocante pela porta fechada. Quando o assunto podia ser de domínio público, abríamos um pouco a porta para abrandar o calor.

Os mensageiros quando não estavam à caça dos seus procurados, ficavam sentadinhos na porta do posto esperando a próxima missão, sem nem desconfiar de sua importância e do quão vitais eram, para o desenvolvimento daquela cidade.

E naquela época a cidade era romântica... Não tinha luz, chegava-se de barco e tinha mensageiros...

O tempo passou e as coisas mudaram. Os telefones fixos chegaram em quase todas as casas. Um verdadeira festa.

As lembranças também são fortes sobre esse acontecimento, novamente importante para todos. Humberto de Campos era um pouco maior que a época do posto, mas menor que hoje.

Todos os prefixos têm quatro dígitos desde que os telefones chegaram (3367) e durante muito tempo minha avó sabia de cor e salteado o número do telefone de todos os amigos e parentes, já que apenas os últimos números mudavam. Era só perguntar:

-Vó, qual é o telefone da Tia Esmeralda?
- 2240, minha filha!

Texto Originalmente publicado na Edição N° 102 março 2013 do Jornal Cazumbá

Imagem Ilustrativa : Internet

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