“Se nós falamos de mortalidade infantil, crianças negras são as que mais sofrem; se nós falamos em mortalidade materna, violência obstétrica, sexual, doméstica e feminicídio, são mulheres negras que mais morrem; se nós falamos em encarceramento em massa, violência policial letal, são jovens negros que são atingidos; e se, por fim, falamos em expectativa de vida, em todos os estados brasileiros pessoas negras vivem menos que pessoas brancas. O fator raça é um elemento central, determinante das desigualdades do país”. Esta declaração fez parte da palestra “A justiça é uma mulher negra: raça e gênero no sistema de justiça brasileiro” da promotora de justiça do Ministério Público da Bahia, Lívia Maria Sant’Anna Vaz, proferida na manhã desta segunda-feira, 27, no auditório do Centro Cultural do Ministério Público do Maranhão.
A atividade encerrou o mês da mulher no Ministério Público do Maranhão e teve o objetivo de promover o diálogo entre os campos do direito, raça e gênero e uma reflexão a respeito da construção de uma justiça pluriversal. Com o auditório lotado, acompanharam a palestra servidores e membros do MPMA, estudantes, operadores do Direito e representantes da sociedade civil organizada.
Sobre o tema especificamente, a representante do MPBA, apontada como uma das 100 pessoas de descendência africana mais influentes do mundo, apresentou dados sobre a presença de pessoas negras tanto no Ministério Público quanto na Magistratura.
No Ministério Público brasileiro, dados de 2017 do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) apontam que 77% dos promotores e procuradores são pessoas brancas, 20% são pardas e somente 2% são pretas, superando apenas as amarelas: 1%. “Nós precisamos quebrar o silêncio, a máscara do silêncio sobre o racismo. E eu fico me perguntando se é possível romper com este pacto narcísico da branquitude no sistema de justiça, porque as pessoas negras não estão lá representadas”.
Antes, Lívia Vaz fez um panorama histórico das leis e normas implementadas no Brasil desde o século XVII até o XX, que contribuíram para manter a exclusão dos negros no país, mesmo depois da abolição da escravatura. “Não há democracia se existir racismo. Por isso, precisamos ser antirracistas”, afirmou.
Além das três formas de racismo: estrutural, institucional e interindividual, a palestra abordou o tema do epistemicídio no contexto cultural das pessoas negras, que é a negação da condição de sujeitos de conhecimento e a imposição do embranquecimento cultural. Esse é um fator determinante para a evasão escolar. “Quantos saberes nós deixamos de acessar de uma comunidade quilombola ou indígena, encastelando os saberes eurocêntricos e coloniais. Por isso, é importante a implementação das leis 10.639/2003 e 11.645/2008”, ressaltou, referindo-se às leis que preveem a implementação no currículo das redes de ensino da obrigatoriedade da temática “História e cultural afro-brasileira e indígena”.
A palestrante dividiu a mesa com a promotora de justiça e coordenadora do Núcleo da Promoção da Diversidade do MPMA, Samira Mercês dos Santos, e com a diretora-geral do Instituto Estadual de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão, Cricielle Muniz.
AUTORIDADES
A atividade foi aberta pela subprocuradora-geral para Assuntos Administrativos, Regina Leite, que elogiou o trabalho da Escola Superior do Ministério Público do Maranhão (ESMP) e do Centro de Apoio Operacional de Enfrentamento à Violência de Gênero (CAO-Mulher) pela defesa dos direitos e proteção das mulheres. “Quero parabenizá-las pelo enfrentamento da violência de gênero e pela luta para que políticas públicas de proteção sejam implementadas de forma humanizada e efetiva, conforme determina a legislação”, enfatizou a procuradora de justiça, que representou, na solenidade, o procurador-geral de justiça, Eduardo Nicolau.
Em seguida, a diretora da ESMP, Karla Adriana Farias Vieira, destacou a importância do tema como forma de quebrar paradigmas no contexto social brasileiro, incluindo no sistema de justiça brasileiro, no qual os negros são minorias. “É preciso descolonizar, retomar as vozes e narrativas das mulheres negras, apagadas violentamente de suas próprias histórias. É preciso ouvi-las. É preciso ocupar, conhecer o perfil étnico-racial do sistema de justiça brasileiro”, disse.
A promotora de justiça Samira Mercês dos Santos apresentou o currículo da palestrante e destacou a importância do tema do debate. “O racismo existe nas instituições. É preciso ser pautado, sempre. É preciso trazer à tona essa discussão e buscar soluções antirracistas no sistema de justiça”, enfatizou.
Ao final, a coordenadora do CAO-Mulher, Sandra Fagundes Garcia, organizadora da programação do mês da mulher, agradeceu a presença e participação de Lívia Vaz.
Também no encerramento o promotor de justiça José Márcio Maia Alves (diretor da Secretaria para Assuntos Institucionais) entregou à palestrante a publicação do Programa de Atuação em Defesa de Direitos Humanos (Padhum).
A atividade contou, ainda, com a apresentação musical de integrantes maranhenses da Marcha Mundial das Mulheres.
Igualmente esteve presente o promotor de justiça Carlos Henrique Rodrigues Vieira (diretor da Secretaria de Planejamento e Gestão), entre outros membros da instituição.
Informação: Ministério Público do Estado do Maranhão
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