domingo, 13 de agosto de 2023
Dia dos pais

Feliz dia para os pais que são pais, para as mães que são pais e para os filhos que são pais. 

O filho que eu quero ter


É comum a gente sonhar, eu sei, quando vem o entardecer
Pois eu também dei de sonhar um sonho lindo de morrer
Vejo um berço e nele eu me debruçar com o pranto a me correr
E assim, chorando, acalentar o filho que eu quero ter
Dorme, meu pequenininho, dorme que a noite já vem
Teu pai está muito sozinho de tanto amor que ele tem

De repente, eu vejo se transformar num menino igual a mim
Que vem correndo me beijar quando eu chegar lá de onde eu vim
Um menino sempre a me perguntar um porquê que não tem fim
Um filho a quem só queira bem e a quem só diga que sim
Dorme, menino levado, dorme que a vida já vem
Teu pai está muito cansado de tanta dor que ele tem

Quando a vida enfim me quiser levar pelo tanto que me deu
Sentir-lhe a barba me roçar no derradeiro beijo seu
E ao sentir, também, sua mão vedar meu olhar dos olhos seus
Ouvir-lhe a voz a me embalar num acalanto de adeus
Dorme, meu pai, sem cuidado, dorme que ao entardecer
Teu filho sonha acordado, com o filho que ele quer ter

Numa tarde ensolarada, na praia de Boa Viagem, em Recife, Toquinho contou pra Vinicius de Moraes que queria ter um filho. Experiente no assunto, o poeta respondeu: “Vai nessa! Dá trabalho, mas é muito bom.”

• Indo além da simples confissão do desejo, Toquinho mostrou para o amigo a melodia que havia composto, com um tom de cantiga de ninar.

Vinicius pegou a composição de Toquinho e escreveu a letra de “O filho que eu quero ter”, pensando até mais em sua experiência de vida do que na ideia do próprio amigo.

A canção foi lançada por Chico Buarque, em 1974. No ano seguinte, Vinicius e Toquinho a colocaram em um álbum em conjunto, que contou com a capa do artista plástico Elifas Andreato.

Na época, Elifas dizia que não queria ter filhos, pois tinha alguns problemas de relacionamento com seu pai, mas contou para Vinicius e Toquinho que a música lhe fez mudar de ideia.

• Dois anos depois, nasceu o Bento. Quando ficou sabendo da novidade, Vinicius disse: “Que bom! Só assim você poderá entender seu pai”.

Voltando pra letra da música, ela pode ser dividida em dois momentos: primeiro, na idealização do filho que o eu-lírico quer ter. Depois, em sua real transformação com a chegada da criança.

A verdade é que a gente idealiza tudo. Criamos a ideia do filho que a gente gostaria de ter, dos pais que queríamos ter tido, da família “perfeita” que é a nossa meta de vida.

Saindo desse mundo hipotético, dizem que o desejo de amar é diferente da capacidade de amar. Enquanto o primeiro seria sonhar com uma ideia nossa, o segundo seria abraçar a realidade da forma como ela é.

Talvez você não concorde com todas as atitudes dos seus familiares, mas, só de ter nascido em um lar onde existe amor — seja ele como for — vale a pena agradecer pela sorte.

Dito isso, desejamos um Feliz Dia para os pais que são pais, para as mães que são pais, para os tios que são pais, para os avós que são pais, para os irmãos que são pais e para os filhos que são pais. Um Feliz Dia pra todo mundo que abre mão da própria vida pra cuidar de outra.

Copo meio cheio
(Baseado em uma história real)


vovô Roberto era o típico velhinho dos filmes. De semblante sereno, olhar doce e um riso fácil, ele só enganava de sério para quem ainda não o conhecia dentro de casa.

• Antes de ser avô, ele foi marido, pai e profissional. Trabalhava duro para manter o que considerava a parte mais importante da vida: sua família.

Depois de passar vários anos no interior, se estabeleceu em Belo Horizonte. Comprou um apartamento no centro da cidade e garantiu que seus filhos tivessem uma boa formação.

Naquela época, era usual que as tarefas ficassem bem dividias: o homem saía pra trabalhar e a mulher ficava em casa cuidando das crianças. Mas, com o Seu Roberto, nunca foi assim.

Apesar de trabalhar fora o dia inteiro, ele fazia questão de ter muito cuidado e carinho com os filhos. Brincava até tarde, ajudava no dever de casa e preparava o café da manhã todos os dias.

• Inclusive, sua mulher, dona Milce, sabia agradar todo mundo pelo paladar — e o Seu Roberto ficava todo babão vendo ela cozinhar.

Apesar de se esforçar para dar o melhor para sua família, ele nunca foi muito ambicioso. É que sabia que a felicidade estava no simples: ter tempo pra desfrutar da companhia de quem se ama.

Aos finais de semana, ele adorava tomar vinho tinto e não recebia ninguém em casa sem tira-gosto na mesa. Acompanhava os jogos do Flamengo pelo rádio e não cansava de assistir seu filme favorito, Casablanca.

Uma de suas netas, Ana Luísa, sabe que a sua avaliação pode parecer parcial, mas acredita que tinha uma conexão com seu avô de outras vidas.

• Ele chamava ela de “pituxinha” e adorava quando ela franzia o nariz, imitando o “narizinho do vovô”.

Quando ela era bebê e a casa ficava cheia de visitas, ele logo dava um jeito de colocar a pequena em seu quarto. O vovô Roberto mimava e protegia mesmo, mas avô é pra isso, né?

A Ana Luísa se lembra das férias que eles passavam na praia. Dos castelos de areia, de como o óculos do seu avô ficava sujo e de ter aprendido, desde cedo, que a felicidade morta perto do mar.

Apesar de tantas lembranças boas, quando o vovô Roberto se foi, aos 93 anos, ela ainda não tomava vinho tinto e não tinha terminado de assistir Casablanca.

A Ana Luísa também não conseguiu dividir com ele suas escolhas profissionais, mas fica feliz de ter aproveitado ao máximo a torrada que seu avô fazia pra ela lanchar na escola.

• Curiosamente, apesar de escrever histórias de amor todo domingo, ela nunca conseguiu escrever nada pra ele.

Talvez porque seu coração aperta de pensar que poderia ter aproveitado melhor o tempo em que ele esteve aqui. Ou talvez porque seja muito difícil colocar no papel aquilo que não tem explicação.

De qualquer forma, seu lado “copo meio cheio” fica feliz em saber que, hoje, ela ama vinho tinto e que Casablanca é o seu filme favorito. Até quando seu óculos fica sujo, ela dá risada lembrando do seu avô na praia.

O seu pai, que também se chama Roberto, nunca soube fazer torradas, mas prepara o café da manhã — e o chá da noite — com o mesmo carinho que aprendeu em casa.

A Ana Luísa sabe como ele sente falta do seu avô, mas hoje quer tranquilizar seu coração. Usando as palavras de Carlos Drummond de Andrade, “não há falta na ausência”, e a do vovô Roberto é pura presença.

A gente sabe que hoje é Dia dos Pais, mas como avô é pai duas vezes, a homenagem veio em dobro — e deixou festa no Céu e na Terra.

Fonte: The Stories / Reprodução 

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